o elevador I

Cumprimentou o porteiro e dirigiu-se ao elevador, como tantas vezes fazia.

Esperou, revendo mentalmente o plano, as palavras que lhe diria. Como tantas vezes fez.

O dia era aquele, tinha que ser. Como sempre teve que ser. Como tiveram que ser todos os dias desde que a conhecera.

Parou no 5º andar e surgiu ela, na porta à espera.

E logo se reavivou uma qualquer conversa que haviam interrompido.

Que correu solta, dali até se sentarem, como sempre faziam.

Ela na cama, ele na velha arca forrada a pele.

E a conversa que não dava tréguas, adiando do plano. Para dali a 5, 10, 15 minutos.

Meia-hora, pronto.

Mas será agora o momento de usar palavras sérias e graves? Logo agora que a conversa parecia imparável?

Há-de surgir o instante certo. Uma pequena interrupção, uma pausa, sei lá.

Mas nunca era, nunca chegava. Todos os instantes eram cilindrados por essa conversa que nunca cessava. Pelas palavras que nunca faltavam. Pelo prazer imenso que era estar ali, com ela. Sem planos, sem nada de importante para dizer.

E o tempo, que voava ligeiro.

Despediram-se então. Sem que ele tivesse dito porque veio. Sem que tivesse interrompido a conversa como tinha planeado. Sem lhe ter feito a inevitável confissão, como tinha que ser.

Só mais tarde, muito mais tarde percebeu que não tinha que ser.

Que não era essa a razão que ali o levava. O motivo era ela, simplesmente.

E esse foi sempre cumprido, em todas as visitas, em todas as conversas.

Não o percebeu nesse dia, enquanto o elevador descia.

Cumprimentou o porteiro, pela última vez.

Olhou para trás, para a porta do elevador que se fechava.

Lá dentro ficaram os planos, desse dia como de todos os outros.

Como sempre…

11 opiniões sobre “o elevador I

  1. Lindo Mano Pedro! Demasiado lindo!
    Vais sim! Vais escrever um livro belo para ler e reler. O mais difícil foi começar, acredita! e não desistas nunca! tens tanto para nos dar, atodos nós que gostamos de ti, assim como és!
    Beijo. Bela

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